13.2.12

ar



abriu-se um riso de luz no meu olhar
e era cedo
tão cedo
          tão ainda tempo de dormir
que fechei as pálpebras
devagar

sonhei com um trevo ao vento
e sete pedras da calçada
                             com pegadas de luar

de mim vi sair estrelas a comporem uma orquestra
em forma de folhas perenes penduradas num altar

nos campos o sol queimava
numa dança excessiva
                           os intervalos da existência

e antevi nos olhos jovens
a velhice a germinar

o dia vestia a noite
 num entardecer fugaz
                          e os ponteiros do relógio
perseguiam-se como loucos
como quem se quer beijar

encenei-me de dormência
num tempo de dar tempo 
                         para o tempo passar
porque o riso dos dias claros
não apaga a noite escura
                          nem o medo          
                                         de chorar

agora 

rio-me  de mim     
                       do   e s p a ç o
             e do tempo

e de nós todos que pensamos
             na importância de pensar

trago no peito todas as mágoas do mundo
    sim
e nos olhos oceanos de folhas por cair
   sim

não são perenes
    não

apenas         não tiveram tempo de
          ainda                                     saltar

mas

também trago na garganta
  as   gar ga lha das   que aprendi

no rodopiar das montanhas
              quando  d 
                            a
                             n
                                ç
                                    a
                                         m 
                                                 com o mar

que a vista do espaço é imensa

e a loucura
        é um passo
num abismo
                            inconsciente


                                                        r
                                                a
                                      o
onde aprendo a      v


ar

Rosário Alves

10 comentários:

Virgínia do Carmo disse...

A vida inteira sob as pálpebras. A respirar palavras. Sôfrega de um peito maior. De um outro ar.

Sempre muito bela a tua escrita, Rosarinho. Obrigada.

Beijinhos

Mel de Carvalho disse...

a fragilidade dos olhos
as asas de borboleta - pele ao redor. e o eixo do tempo em que se desfaz o verbo e se refaz de novo.

"porque o riso dos dias claros
não apaga a noite escura
nem o medo
de chorar"

assim, é, amiga.
beijo e a minha confirmada e manifesta admiração por ti (na escrita e além dela)

Vera de Vilhena disse...

Maravilhoso, minha querida amiga. Amei o arranjo gráfico. Acho que devias adoptar :)
Um abraço muito doce

Mª João C.Martins disse...

O teu riso, Rosarinho...
esse luminoso rasgo de alma, aqui, a rodopiar sobre a pele das palavras.
Mergulhar ou voar, tudo é tanto, porque a vida é inteira e chorar, é como estender uma madrugada para dentro das pálpebras.

Belo, muito belo!
Como não hei de eu sentir-me grata?!

Beijinho

Mar Arável disse...

Belíssimo na forma

e no voejar

PAS[Ç]SOS disse...

voar...
sustido num fio de doçura,
tecendo um ninho com restos de palavras
onde o tempo sorri...
devagar...
só por pensar.

AC disse...

Que bom é viajar nestas palavras...!
Muito bom!

Beijo :)

ponto e virgula disse...

"... das montanhas quando dançam com o mar...".

meia dúzia de palavras, resumo de outras tantas que li, dando sentido a um vôo com lotação esgotada... de poesia.




a...té

Lídia Borges disse...

Belíssimo poema! Flui como um rio e ouve-se... E vê-se como água que corre, como voz a subir e descer ao ritmo da respiração.

Um beijo

tb disse...

Belíssimo!
Beijo.