abriu-se um riso de luz no meu olhar
e era cedo
tão cedo
tão ainda tempo de dormir
que fechei as pálpebras
devagar
sonhei com um trevo ao vento
e sete pedras da calçada
com pegadas de luar
de mim vi sair estrelas a comporem uma orquestra
em forma de folhas perenes penduradas num altar
em forma de folhas perenes penduradas num altar
nos campos o sol queimava
numa dança excessiva
os intervalos da existência
e antevi nos olhos jovens
a velhice a germinar
o dia vestia a noite
num entardecer fugaz
e os ponteiros do relógio
perseguiam-se como loucos
como quem se quer beijar
encenei-me de dormência
num tempo de dar tempo
para o tempo passar
porque o riso dos dias claros
não apaga a noite escura
nem o medo
de chorar
agora
rio-me de mim
do e s p a ç o
e do tempo
e de nós todos que pensamos
na importância de pensar
trago no peito todas as mágoas do mundo
sim
e nos olhos oceanos de folhas por cair
sim
não são perenes
não
apenas não tiveram tempo de
ainda saltar
mas
também trago na garganta
as gar ga lha das que aprendi
no rodopiar das montanhas
quando d
a
n
ç
a
m
com o mar
que a vista do espaço é imensa
e a loucura
é um passo
num abismo
inconsciente
r
a
o
onde aprendo a v
ar
Rosário Alves
10 comentários:
A vida inteira sob as pálpebras. A respirar palavras. Sôfrega de um peito maior. De um outro ar.
Sempre muito bela a tua escrita, Rosarinho. Obrigada.
Beijinhos
a fragilidade dos olhos
as asas de borboleta - pele ao redor. e o eixo do tempo em que se desfaz o verbo e se refaz de novo.
"porque o riso dos dias claros
não apaga a noite escura
nem o medo
de chorar"
assim, é, amiga.
beijo e a minha confirmada e manifesta admiração por ti (na escrita e além dela)
Maravilhoso, minha querida amiga. Amei o arranjo gráfico. Acho que devias adoptar :)
Um abraço muito doce
O teu riso, Rosarinho...
esse luminoso rasgo de alma, aqui, a rodopiar sobre a pele das palavras.
Mergulhar ou voar, tudo é tanto, porque a vida é inteira e chorar, é como estender uma madrugada para dentro das pálpebras.
Belo, muito belo!
Como não hei de eu sentir-me grata?!
Beijinho
Belíssimo na forma
e no voejar
voar...
sustido num fio de doçura,
tecendo um ninho com restos de palavras
onde o tempo sorri...
devagar...
só por pensar.
Que bom é viajar nestas palavras...!
Muito bom!
Beijo :)
"... das montanhas quando dançam com o mar...".
meia dúzia de palavras, resumo de outras tantas que li, dando sentido a um vôo com lotação esgotada... de poesia.
a...té
Belíssimo poema! Flui como um rio e ouve-se... E vê-se como água que corre, como voz a subir e descer ao ritmo da respiração.
Um beijo
Belíssimo!
Beijo.
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